Restos mortais

We are the world, we are the children...
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Passei cinco semestres da minha vida estudando antropologia. Não aprendi nada! Minha única vaga lembrança está na frase de Levi-Strauss de que há alimentos bons para comer e outros bons para pensar. E se ainda lembro disso é por conta do meu amigo Kleber, esse sim o maior antropólogo que conheci; na sua majestosa inteligência ele dizia que há pessoas boas para comer e outras boas para fazer pensar. Michael Jackson não devia ser bom para comer, no entanto ninguém melhor que ele para nos fazer pensar. Admito que nunca gostei das músicas ou da dança do sujeito e tampouco sei dizer se ele tinha algum talento ou não, mas também admito que ninguém no mundo representou tão bem o papel de astro pop. O maluco era de certa forma uma imagem refletida do absurdo do mundo contemporâneo e, como tal, um reflexo de cada um de nós. Michael era absurdo porque tinha que ser um não humano, uma mentira, uma imagem, um produto no corpo de gente, na carne humana sem desejos e sem impulsos. Por conta disso, depois da morte, não pode haver corpo porque o corpo era o produto, e este não pode morrer. O conflito entre o homem que se negava a ser homem e a imagem construída de ídolo massacrava o primeiro e rendia estilo ao segundo. A sua morte é o melhor que podia ter ocorrido, todos saem ganhando, ganham os fãs, ganham os empresários, ganha a mídia, ganha o homem-produto. Michael Jackson, no pouco de humano que lhe restava, tentava negar o mundo que o construiu e o destruiu porque o conflito era inevitável; assim como Elvis, ele foi sendo morto aos poucos, foi se negando aos poucos, foi se matando aos poucos... Os vermes, que também nada entendem de antropologia, não deverão ter dúvidas se seu corpo será melhor para comer ou para pensar!