País dos sacripantas I

A moral e as palavras impronunciáveis
.
Este é o país dos sacripantas! Todo mundo se finge de beato! Somos santos de nascimento e batismo e não podemos ver, ouvir nem pensar coisas impuras. Nossa última cruzada de moralismo puritano foi contra um inofensivo livro de charges sobre futebol, o Dez na área, um na banheira e nenhum no gol. Pois é, como nossa educação pública é de reconhecida excelência, nossos defensores da moral e da família não tinham com o que se preocupar e resolveram voltar seus esforços contra um livro que sem querer foi parar no lugar errado, na hora errada; o coitado foi equivocadamente indicado para crianças da terceira série do ensino fundamental. Começou o pega pra capar! O pobre do livro, que nada tinha a ver com as preocupações dos nossos moralistas, foi recolhido pelo governo sob a grave acusação de que ele tinha cu, tinha rola e tinha merda. Tudo bem que a rôla do livro tinha um circunflexo que as rolas normais não devem ter, mas o motivo da apreensão e do seu triste destino foram outros. A preocupação não estava em saber se a rola do livro era igual à rola do Aurélio. O problema era que a publicação fazia referências à sexualidade e às drogas, coisas que anjos de nove anos não devem e não podem ter acesso. Tudo bem, talvez não seja na escola que a criança deva aprender o que é cu ou o que é puta, mas também não é preciso que se retirem os livros das escolas como se a sua presença representasse uma ameaça à sociedade. Se eles não servem para crianças de nove, quem sabe não podem ser úteis aos de treze ou catorze, idade em que a porra já não lhes sai da boca e o cu e a merda estão mais presentes que as mães e as professoras.