Cidade maravilhosa

Natureza, homens e cidade
.
O Rio é uma cidade maravilhosa, mas sua beleza não é tão evidente e simples quanto aquela que se quer vender aos turistas. O fascínio do Rio não está em Ipanema ou no Leblon; nem nas pedras do Corcovado, da Urca, das calçadas de Copacabana ou das mãos dos traficantes. A beleza fascinante está na sua absoluta decadência, na sobreposição dos tempos vividos e perdidos e na tragédia da beleza de uma alegria sem sentido; a magia da cidade está nos becos estreitos e nos paralelepípedos do centro velho, onde ainda se pode ver as sombras de Machado de Assis, do seu Nelson e do Sobrenatural de Almeida, está na feiúra dos prédios de arquitetura soviética e nos casarões e palacetes mal-cuidados que evidenciam a irrelevância da beleza perante a vida cotidiana. Em cada canto, cada rosto e cada paisagem espelham o mais completo caos urbano e a tristeza da vida sem sentido, um resultado maluco de uma guerra constante entre natureza, homens e cidade; de batalhas em que todos saem perdendo mas onde ninguém é derrotado em definitivo. Mas suas ruas e becos são expressões fortes que nos trazem lembranças de uma vida que gente não viveu e são as marcas da cidade mágica que guarda mais de um século de um descaso que se inicia com o fim da monarquia e se que intensifica no desprezo cotidiano de cada habitante. No Rio, o belo é o inesperado, é o conflito, é a tristeza, é a angústia, é o que poderia ter sido e não foi.